Parir, ser mãe e ser mulher

 

 

A vida tem duas faces:
Positiva e negativa
O passado foi duro
mas deixou o seu legado
Saber viver é a grande sabedoria
Que eu possa dignificar
Minha condição de mulher,
Aceitar suas limitações
E me fazer pedra de segurança
dos valores que vão desmoronando.
Nasci em tempos rudes
Aceitei contradições
lutas e pedras
como lições de vida
e delas me sirvo”

Cora Coralina

Vivemos em uma era de radicalizações. Vejo que cada vez mais através do Planeta as pessoas e os grupos tendem à se polarizar. Quem sabe isso não seja bem novo… Quem sabe o Ser Humano desde sempre tenha tido essa necessidade de simplificar, radicalizar para que possa sentir que compreende o sentido da vida e pertence de fato à algo. Talvez por isso os jovens sejam tão propensos ao radicalismo, pela necessidade básica humana de se identificar à algo, à alguém, em busca de sua própria identidade e sentido.

Hoje cheguei a conclusão que parir, ser mãe e ser mulher são três coisas bem diferentes! Elas podem ter pontos comuns e até se cruzar de vez em quando mas são bem distintas. Até hoje ainda precisamos ser mulheres para poder parir! Mas parir atualmente por via vaginal, como desenhou a Natureza, virou no Brasil uma raridade sobretudo na classe média alta. Todos sabemos que muitos hospitais particulares brasileiros tem taxas de partos cirúrgicos acima de 80%, alguns chegam muito perto de 100%. Então a busca por um parto vaginal, e mais, por um parto natural sem violências e intervenções desnecessárias, virou um ato quase heróico no cenário nacional!

Por isso as mulheres celebram muito, com razão, quando têm esse tipo de parto. Elas celebram e o Movimento pela Humanização do Parto divulga, também com razão, os benefícios de parir como a Natureza entende. Mas a cesárea, o parto cirúrgico, não é por si só algo de negativo. Negativo em saúde materno-infantil, segundo a OMS, é ter cesáreas de menos e cesáreas demais. Considerando que negativo é quando as taxas de mortalidade materno-infantil são mais altas que deveriam ser. O Brasil paradoxalmente (que surpresa!!) entra nas duas categorias! Temos cesáreas demais nos hospitais particulares e nas classes A e B e não temos cesáreas suficientes em algumas regiões afastadas e classes sociais mais baixas onde a Assistência necessária não chega ou chega mal. Nos dois casos não diminuímos as taxas de mortalidade por razões opostas: a falta e o excesso de cesáreas.

Então vivemos dizendo: não somos contra o parto cirúrgico bem indicado, uma cesariana bem indicada pode salvar até duas vidas. Inclusive uma cesárea com indicação pode e deve ser “Humanizada”.  Mas na prática, mulheres que fizeram “tudo direitinho” nessa busca heróica por um parto digno (concepção consciente, exercícios pré-natais, alimentação sã, cursos pré-natais, equipe humanizada, parto domiciliar, etc, etc) e que têm uma cesárea bem indicada (por vezes humanizada outras não) acabam se sentindo ostracizadas. Eu infelizmente não estou exagerando! Já ouvi mais de uma mulher, em mais de um contexto, em mais de um lugar relatar esse sentimento.

Na cabeça de muitas pessoas do “Movimento pela Humanização do Parto” existe, e é difundido consciente ou inconscientemente, um certo e errado, um preto e branco de realidades definitivas. Se uma mulher do “Movimento” fez todos os atos heroícos associados à tentar um parto natural “humanizado” (que aparenta ser a garantia da solução para todos os males da Humanidade) hoje no Brasil e mesmo assim acabou com uma cesariana com uma indicação não muito precisa (por exemplo parada de progresso) as pessoas tendem a pensar duas coisas: a mulher ou então a equipe fez algo de “errado”. Isso é fato!!! O “Tribunal do Parto Normal Humanizado”, fiel a sua forma de realidades definitivas, ouve mais ou menos e depois julga! E as mulheres sentem isso, não tem como não sentir. E nós parteiras também sentimos!

Outra realidade é que um parto que foi planejado para acontecer em casa, onde houve um investimento massivo de tempo, energia e dinheiro, onde criou-se um vínculo com a equipe e um sonho do “parto ideal,” e que termina em cesariana gera um processo muito profundo e complexo de luto. A mulher é claro que vai viver esse luto mais intensamente. Porém nós profissionais também vivemos um processo de luto. Nós também passamos por sentimentos intensos: será que eu fiz tudo o que podia, será que eu poderia/devia ter feito algo diferente, será que eu fiz algo de errado? E à isso adicionamos, durante e após as transferências, experiências por vezes profundamente antagônicas e agressivas com nossos colegas que não aprovam nossas escolhas de Assistência e não compreendem um Paradigma de Assistência diferente do deles. A mulher vai se perguntar e viver as mesmas coisas e também a muitas vezes mais doída pergunta: será que há algo de errado comigo? E como o processo de luto traz entre outros sentimentos raiva e tristeza, muitas vezes essa raiva é direcionada à equipe. E ao invés de aproveitar o processo para um crescimento e aprendizagem mútuos perdemos tempo martirizando-nos ou acusando-nos junta ou separadamente. Por que muitas vezes questões profundas e difíceis de lidar são acionadas dos dois lados.

A verdade é que estatisticamente e em um mundo com uma Assistência ideal uma parte minoritária ( 5-20%) dos nascimentos terminarão em cesarianas. Outra verdade é que estatisticamente, também nesse mundo do atendimento ideal, uma pequena porcentagem de partos terminarão em óbitos isso seja onde for (hospital, casa, centro cirúrgico, etc). Infelizmente hoje nem nos sistemas de atendimento mais ideias não conseguimos erradicar a morte no parto. Quem sabe um dia cheguemos lá, mas por enquanto podemos fazer somente o possível. E o possível inclui entre outros uma cesariana bem indicada mesmo se a indicação não era ainda muito explicita (ex: parada de progesso e exaustão materna). Se sabemos que isso tudo é normal e real por que não queremos falar disso? Onde está a dificuldade?

Face ao processo difícil vivido tanto por mim como pelas mulheres que atendi que acabaram com uma transferência e/ou uma cesariana, organizei algumas vezes grupos de apoio para que os sentimentos fossem exteriorizados e compartilhados. Vi como isso ajuda todo mundo no processo. Uma dessas mulheres, em seu processo pessoal de luto depois de uma cesárea decorrente de uma transferência de um parto domiciliar, primeiro se afastou de mim e de todos. Depois fez suas próprias pesquisas e trabalho pessoal. Ela encontrou pela internet e decidiu participar de um grupo chamado Homebirth Cesarean International. Depois de entender algumas coisas ela voltou, estudou para ser doula, participou de um encontro do grupo de apoio e criou o seu próprio grupo de apoio no Facebook.

O Homebirth Cesarean International (HBCI), que eu conheci graças á essa mulher, tem feito um bom trabalho em um assunto muito delicado. Elas publicaram entre outros dois livros: “Homebirth Cesarean: Stories and Support for Families and Healthcare Providers e “Healing from a Homebirth Cesarean. Uma das sugestões que elas fazem é que os profissionais que trabalham com parto domiciliar abordem o Plano B de transferência e também o que elas chamam de Plano C em caso de cesárea. Muitos profissionais se questionam sobre o ato de abordar o tema de uma possível cesárea no acompanhamento pré-natal. Será que não vamos minar a confiança dessa mulher que tão heroicamente se investe de corpo e alma na busca de um sonhado parto natural em condições tão adversas? Conversando com mulheres que tiveram uma cesárea após uma transferência de um parto domiciliar em um Fórum de discussão da HBCI a parteira americana Amanda Roe chegou a seguinte conclusão: “Eu conheço tantas mulheres naquele grupo que gostariam que sua parteira pudesse ter olhado diretamente em seus olhos e dito algo como: “Um nascimento por cesariana no seu caso não é o desfecho mais provável mas é um desfecho possível, e eu serei sua parteira e ficarei com você mesmo se eu não for a pessoa que receberá o seu bebê”.

Ouço muitas mulheres relatando o sentimento de se sentir “menos mulher” por não ter parido vaginalmente. Todo sentimento merece ser escutado. Em seguida o ideal é que possamos olha-lo de frente e explorar o que ele quer nos dizer. Por que entre a realidade da vida e a realidade do que sentimos pode haver um mundo inexplorado que vai nos ajudar a crescer e viver melhor. Pode parecer paradoxal mas uma das minhas professoras mais sensíveis as questões emocionais das mulheres que ela atende não é mãe e nunca pariu. Ela é uma mulher sensível, trabalhada, carinhosa e competente no que se dispõe a fazer. Pensem bem e olhem a sua volta: quantas mulheres que conhecemos não são mães? Será que elas são “menos mulheres” por isso? Quantas mães exemplares que conhecemos nunca pariram e talvez nem gestaram? Ser mãe, ser mulher e parir são três coisas distintas, são vias que em pleno século XXI temos o luxo de escolher ou não percorrer ou ainda com qual profundidade.

Vi vários bebês nascidos de cesariana intraparto que pegam o peito imediatamente com gana e mamam com facilidade depois disso também. Já vi vários bebês nascidos de partos domiciliares “perfeitos”, os “partaços” que o pessoal costuma contar por aí, que não querem mamar imediatamente e que em seguida têm um processo de amamentação complicado! Já vi o oposto também! Já vi mulheres que tiveram cesáreas e que se enamoram imediatamente de suas crias enquanto vi outras que tiveram parto domiciliar demorarem um pouco pra reconhecer e se acostumar com a dança interna e externa gerada pela presença daquele novo Ser em sua vida! E já vi o inverso! Ou seja: somos seres complexos! E mais: a maternidade como a gestação e o parto são danças à dois! Abracemos a  beleza da complexidade e a heterogeneidade da vida sem exceções!

“Porque toda a humanidade nasceu de uma mulher
Toda a humanidade veio de uma mulher
Porque toda a humanidade nasceu de uma mulher
Toda humanidade veio de uma mulher

Então me encare finja que já me conhece
Sou forte aparentemente mas valho como toda gente
Fique aqui tome alguma coisa converse pra se distrair
Vai ver que sou uma menina que é capaz de lhe fazer feliz

Quero te ver se você quiser
Quero ver você se você vier
Só vou te ver se você quiser
Só ver você se você vier”

Vanessa da Mata, mulher e mãe de três filhos sem ter parido

 

 

Mudar Paradigmas

Eu adoro ler! Adoro um bom livro. Estou conseguindo nesse momento da minha vida ler bastante e sobre temas variados. Graças ao maravilhoso Sistema de Bibliotecas Públicas do Québec! Que benção! Como isso é bom, um sistema de bibliotecas públicas é tudo pra quem gosta de pensar e/ou ler! Junto com a Internet então, fechou!!

Estou me deliciando com o livro “The Power of Women” da parteira norte americana cherokee Sister Morning Star da qual eu já falei nesse post anterior (esse eu comprei na Conferência da Midwifery Today e vai para a minha biblioteca de empréstimos, na minha salinha de atendimento querida em Brasília, aguardem!). Estou sorvendo as palavras de Sister ou Estrella, dependendo de onde ela esteja, como quem sorve uma boa xícara de chá (que eu adoro!) quentinho! Aos poucos me deliciando com o que ela chama de “medicina da palavra”. Aliás eu quero corrigir as palavras da Benção Cherokee que ela ensina! Eu escrevi, no post em questão, de lembrança apenas mas no livro está escrito como ela nos ensinou: “May you live long enough to know why you were born”, “Que você viva o suficiente para saber porquê nasceu”. Essa benção é feita sob a luz do sol ou da lua dependendo do momento que a criança nasceu.

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Algumas palavras do livro que me tocam: “The psycho-spiritual-emotional-cultural aspects of a woman far outweight her physical nature; they actually create it.”  “Os aspectos psico-espiritual-emocional-cultural de uma mulher de longe ultrapassam sua natureza física; na verdade eles a criam.” p. 8  “Sometimes babies design a mother’s birth.” “Por vezes bebês desenham o parto de uma mãe.” p. 14

Agora vamos mudar de livro! O livro “The Structure of Scientific Revolutions”  “A Estrutura das Revoluções Científicas” é um Clássico no mundo acadêmico! Clássico assim mesmo com C maiúsculo! Meu marido acadêmico em Ciências Políticas quando viu o livro na minha mesa de cabeceira esclamou: “Você está lendo Kunh?!” Sim, também estou lendo e me deliciando com Kunh, sorvendo a medicina das palavras dele! Esse livro dá pra achar em PDf por aí, viva a Internet!!

Pra quem ainda não sabe, Thomas Kunh é o pai da noção de Paradigma Científico e Mudança de Paradigma. Ele escreveu sobre isso em 1962 e o trabalho ainda é A referência nesse tema. Um pouco das palavras de Kunh: “Paradigms: Universally recognized scientific achievements that for a time provide model problems and solutions for a community of practitioners” p. X. Tenho em mãos uma versão em inglês do livro, existe uma tradução em português, porém vou fazer minha tradução livre por aqui, perdoem-me! “Paradigmas: conquistas científicas universalmente reconhecidas que por um tempo provêm problemas modelos e soluções para uma comunidade de praticantes.”; ” (…) the more certain they [the historians of science] feel that those once current views of nature were, as a whole, neither less scietific nor more the product of human idiosyncrasy than those current today. If these out of date beliefs are to be called myth, than myths can be produced by the same sorts of methods and held for the same sort of reasons that now lead to scientific knowledge. If on the other hand they are to be called science, then science has included bodies of belief quite incompatible with the ones we hold today. (…) Out-of-date theories are not in principle unscientific because they have been discarded.” p.2. “(…) quanto mais certeza eles [historiadores científicos] têm de que aquelas visões da natureza correntes em uma certa época foram, como um todo, nem menos científicas nem mais o produto da idiosincrasia humana do que aquelas correntes hoje. Se essas crenças depassadas devem ser chamadas de mito, então mitos podem ser produzidos pelos mesmos tipos de métodos e retidos pelos mesmos tipos de razões que hoje levam ao conhecimento científico. Se por um outro lado elas devem ser chamadas de ciência, então a ciência já incluiu conjuntos de crenças um tanto incompatíveis com as que temos hoje. (…) Teorias defasadas não são em princípio não científicas  por que foram descartadas.”

No começo do mês de março fiz um seminário de um dia com a semiologista Stéphanie St-Amant aqui em Montreal. Foi mais um reencontro. Stéphanie e eu fomos colegas no Grupo MAMAN na mesma época, aquela do processo de legalisação das Casas-de-Parto de da profissão de parteira no Québec na segunda metade dos anos 90. Estamos nessa há um tempinho! O seminário se intitulou: “História crítica das práticas obstétricais e sua rationale”. Também gosto de ir á lugares, formações e de encontrar ou reencontrar pessoas que gostam de refletir. Não me interessa se essas pessoas venham da mesma especialidade, formação ou classe social que eu. Aprecio boas reflexões mesmo não necessariamente concordando com elas contanto que exista respeito e apreciação mútua. Trocar sempre soma!

Stéphanie colocou muitas coisas. Mas passou um bom tempo sobre a noção e a concepção da obstetrícia de datação da gestação. Ao longo da história chegando até hoje. Porque datação específicamente? Por que hoje no Québec (do qual ela fala mais especificamente) e no mundo existe uma tendência crescente nas induções de parto (farmacológicas ou não).

Recentemente na Mídia e nas Redes Sociais têm se falado muito sobre a segunda gestação e parto por vir  da Duquesa de Cambridge. E circulou nas Redes Sociais esse artigo sobre a questão de pós-datas e indução no caso da célebre Duquesa. E aí os ativistas do parto humanizado compartilham dizendo: olha aí, podemos esperar e pós-datismo não é indicação de cesárea! E os médicos (não necessariamente os cesáristas) compartilham dizendo: olha aí, mas se a gestação virar de risco vai precisar das intervenções X, Y Z e estamos aqui pra isso! E no mundo atual, não só no Brasil, a segunda visão está ganhando! E as induções aumentando e as cesárias também! Mas será que as duas visões não podem trabalhar juntas?

Por um outro lado têm gente muito otimista! Gente que está aí na luta pela “Humanização” como novo Paradigma de Assistência ao nascimento há décadas (20, 30 anos) que diz que as coisas no Brasil mudaram e muito! Veja essa entrevista da Mater TV com a Enfermeira Obstétrica baiana Mary Galvão por exemplo. E mesmo assim os índices globais de cesárea continuam a subir no Brasil e no resto do mundo. Enquanto isso experiências específicas em diversos lugares do mundo, inclusive no Brasil, mostram que é  de fato possível ter os famosos índices de 15% de cesárea sugeridos pela OMS de maneira segura utilizando adequadamente a tecnologia de ponta do século XXI , tecnologias antigas, milenares e recursos humanos treinados (formalmente ou não) para atuar em diversos escalões da Assistência (primária, secundária e terceária).

Do que se trata então? Como essa “Mudança de Paradigma” pode se fazer de maneira efetiva sem deixar ninguém de fora?  Ainda continuo refletindo, lendo Sister Morning Star e Thomas Kuhn, no momento! Ainda me questiono sobre que Paradigma Novo é esse que queremos e até onde a “Medicina Baseada em Evidências” é tão científica e tão maravilhosa quanto pretendemos…

Independente de concordar ou não ideológica ou filosóficamente com alguém, posso apreciar uma vontade genuína de contribuir para o avanço do Ser Humano nesse planeta. E por isso mesmo discordando de muita gente do “Movimento pela Humanização do Nascimento” (que está longe de ser um conjunto homogêneo de pesoas) continuo dialogando e trabalhando em parceria, de perto e de longe com essas pessoas. Muitas vezes tenho a impressão de que os profissionais médicos (médicos, enfermeiras, etc)  têm uma aversão viceral, quase que irracional a nós parteiras! Sobretudo á aquelas sem formação formal. E isso escapa a minha compreensão! Dois, ou mais, Modelos de Assistência distintos podem viver em paz, podem muito bem colaborar trabalhando juntos pelo bem comum. Não precisamos todos pensarmos igualzinho, sermos iguaizinhos! Isso é possível basta vontade e humildade suficientes de todos os lados.

Cito aqui para terminar um outro pensador, não pelo seu pedigree que é enorme e incontestável, nem por suas orientações políticas, que são sempre por natureza questionáveis, mas por traços que eu admiro em alguém; a capacidade de pensar e a coragem (que vem de cor, coração, lembram?) de dizer o que precisa ser dito: “Em um longo discurso sobre problemas enfrentados pelo Brasil, o ministro [Roberto Mangabeira Unger] criticou o modelo atual de ensino. Ele disse que um novo projeito nacional tem de ser produtivista e nacionalizador e vir acompanhado de uma revolução na educação pública. “Nosso ensino público é uma imitação do ensino francês do século 19, baseado em decoreba. Nosso método de ensino é uma camisa de força dogmática. É hora de tirar essa camisa de força”, afirmou.”

Pensemos e ajamos juntos e juntas, com sensatez e coragem, tiremos nossas camisas de força pelo bem de todas e todos e a felicidade geral!

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Livros, História e Medicalização do Nascimento

Esse mês de dezembro meu filho mais velho Yuri vai fazer 17 anos. Ele nasceu na Casa de Parto (Maison de Naissance) Côte-des-Neige em um dia lindo onde caia uma neve bem fina, meu melhor presente de Natal! Foi também meu primeiro e mais profundo mergulho no mundo do parto e nascimento. Por isso e muitas outras coisas eu sempre lhe serei grata meu filho!

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Em 1997 as Casas de Parto na Província de Québec, assim como as parteiras profissionais (autônomas), estavam em um período de projeto-piloto. Era a fase de teste para ver se dava certo esse negócio de parir com parteira! De lá até aqui muita coisa mudou tanto para as parteiras e as Casas de Parto do Québec quanto para mim e o Yuri!

Então foi com grande alegria que participei do lançamento do livro L’Histoire de l’accouchement dans un Québec Moderne  (A História do parto em um Québec Moderno)  de Andrée Rivard na quinta-feira passada dia 27/11. Também celebrava-se 20 anos de Casas de Parto e parteiras integradas no Sistema de Saúde na Província de Quebec!

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O lançamento foi na Casa (Maison) Parent-Roback num edifício no bairro histórico do Velho Porto de Montreal. É um edifício que abriga vários Organismos de Ação Comunitária pelo direito das mulheres entre eles o  Regroupement Naissance Renaissance (Coletivo Nascimento Renascimento) que atua há 30 anos na cena dos direitos das mulheres no período perinatal entre outros reagrupando diversos Grupos da Província que trabalham sobre o mesmo tema. Também apoiaram o lançamento o Regroupement Les Sage-femmes du Québec e o Groupe MAMAN uma Associação de usuárias da qual eu fiz parte de 1998 à 2001 antes de sair do Québec!

Foi tudo muito significativo como vocês podem perceber! Pois lá estavam pessoas com quem eu convivi 17 anos atrás que continuam firmes e fortes no ativismo! Foi uma nova visita ao Regroupement Naissance Renaissance, a última  foi em 1999 gestando minha filha Aysha! Uma viagem histórica em todos os sentidos! Inclusive de reconexão com a minha história. Houve uma leitura de passagens do livro por uma membro do Groupe MAMAN que é atriz a emoção na sala cheia era palpável! Não tive nem coragem te tirar fotos por respeito ao momento!

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Agora uma coisa sempre me chama atenção: como fora do Brasil se fala de medicalização do parto e como no Brasil não é um tema que é muito discutido. No Brasil o que prima sempre é a “humanização do parto”.  Quase nunca ouço ou leio debates, reflexões, inquisições (nos dois sentidos da palavra) sobre a “medicalização do parto”. “Medicalização” no Brasil sempre está associada ao excesso de cesáreas, o que é compreensível. Mas por aqui “medicalização” fala de: hospitalização, procedimentos sem indicação, monopólio médico do parto, etc. Ou seja uma visão totalmente crítica do Modelo de Assistência Obstétrico. E sempre me perguntei: porque será que existe essa diferença? Não sei ao certo…mas sinto que é quase um tabu falar de medicalização do parto no Brasil como um questionamento mais além do excesso de cesáreas. Parece que isso incomoda de alguma forma. Ao mesmo tempo, o fato do parto ser um evento médico, estar no âmbito médico e acadêmico aparentemente não pode ser muito questionado. Um dos meus primeiros trabalhos da minha formação de parteira no Texas foi sobre a História das Parteiras. Assim, bem geral. É impossível olhar honestamente para a História do parto e nascimento e da profissão de parteira e não ver  a medicalização do parto e nascimento entre outros como uma questão de gênero, de classe e de poder. A contracapa do livro de Andrée Rivard diz assim no segundo parágrafo: “(…) Longe de ter efeitos favoráveis, a medicalização do nascimento é um fenômeno muito controverso. (…)” Tá aí, quem sabe é essa controvérsia que gera dificuldades no Brasil! Temos muitos médicos, médicos do bem, que estão aí desde começo no “Movimento pela Humanização do Parto e Nascimento”, outros que chegaram agora ou há pouco e que bom! Quem sabe, somente, quem sabe queremos evitar controvérsias demais? Será?

Outro feliz re-encontro que fiz no lançamento foi da pesquisadora e autora Hélène Vadeboncoeur. Hélène é a autora do excelente livro: Parto Natural: Mesmo Após uma Cesárea que acaba de ser lançado no Brasil em português pela primeira vez em outubro! Fiquei muito feliz de revê-la e creio que foi recíproco! Ela está trabalhando em lançar uma parte do site dela em português em muito breve. Com informações e relatos. É um livro excelente que eu já disponibilizava para minhas clientes em inglês. Agora isso será possível em português!  Hélène é uma pesquisadora de primeiríssima! Ela me pediu alguma ajuda e dicas nas traduções do site para o português e fico muito feliz em poder ajudar. Quanto mais informações de qualidade tivermos disponível mais fácil será empoderar as mulheres para que possam fazer escolhas conscientes.

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Conheci também a Jessica Gerlach uma imigrante de Curitiba que mora há 5 anos aqui e está fazendo seu mestrado em Sociologia na Universidade de Montreal. Ela pensa trabalhar com a Comunidade de Imigrantes brasileiras por aqui creio entender sobre a percepção do parto ou ainda as experiências de parto. Conversando com ela e Hélène, já que essa ultima não pode ir ao Brasil para o lançamento do livro em português, surgiu a ideia de um lançamento do livro da Hélène  para a Comunidade Brasileira do Quebec! Vamos ver se essa ideia se concretizará!

Deixo pra vocês minha tradução livre da dedicatória da Andrée Rivard:

“Para Paloma: Devemos nos acomodar da herança ou reinventa-la a nossa maneira? Essa é a questão! Boa Leitura!”